A Polícia Civil do Rio Grande do Sul revelou um dos maiores esquemas de fraudes processuais já registrados no país, conhecido como Operação Malus Doctor, que desmontou uma quadrilha especializada em golpes contra instituições financeiras. O grupo criminoso usava ações judiciais falsas para enganar bancos e clientes em diversos estados, sobretudo no Rio Grande do Sul e em São Paulo. A operação investiga mais de 145 mil processos fraudulentos que geraram um prejuízo que pode alcançar R$ 50 milhões. A fraude usava documentos falsificados e até nomes de pessoas falecidas para dar aparência de legalidade às ações.
Segundo os investigadores, o esquema envolvia advogados e intermediários que conseguiam dados de aposentados e pensionistas, muitas vezes sem o consentimento deles. Os golpistas abriam processos de revisão de empréstimos consignados sem que os verdadeiros titulares soubessem. Em seguida, novos empréstimos eram contratados em nome dessas pessoas, que só percebiam o golpe quando seus benefícios previdenciários começavam a sofrer descontos indevidos. As vítimas acreditavam que estavam contratando um serviço legítimo, quando na verdade estavam sendo usadas como instrumento para a quadrilha desviar recursos de instituições bancárias.
A prática ilegal se estendia para além das vítimas vivas. A Operação Malus Doctor identificou dezenas de ações judiciais abertas em nome de pessoas já falecidas. Em um dos casos, uma assinatura usada para dar validade a uma procuração foi datada dias depois do óbito da suposta titular. A organização criminosa também adotava uma estratégia chamada de fatiamento de demandas, distribuindo as ações entre diferentes advogados e comarcas do país, dificultando a identificação do padrão fraudulento pelos tribunais. Essa pulverização também visava burlar os sistemas de controle do Judiciário.
O principal investigado no caso aparece como o quinto maior litigante do estado do Rio Grande do Sul, sendo responsável por quase metade das ações contra bancos naquele território. Esse volume desproporcional de processos chamou a atenção das autoridades e foi o ponto de partida para as investigações. Os agentes cumpriram 74 medidas judiciais, entre mandados de busca e apreensão, bloqueios de bens, suspensão de advogados e quebras de sigilo bancário e fiscal. Até o momento, 14 pessoas são formalmente investigadas e uma prisão foi efetuada.
Durante as buscas realizadas nas cidades de Porto Alegre, Glorinha e Xangri-Lá, a Polícia Civil apreendeu carros de luxo, entre eles modelos das marcas Maserati, BMW e Mercedes-Benz. Os veículos indicam o alto padrão de vida mantido pelos suspeitos às custas do dinheiro desviado de aposentados e bancos. A operação reforça o compromisso das forças policiais com o combate a fraudes sofisticadas que afetam tanto instituições quanto cidadãos comuns. A Polícia Civil afirma que as investigações continuam e novos nomes podem surgir nos próximos dias.
O golpe judicial investigado na Operação Malus Doctor ilustra um problema estrutural no sistema jurídico brasileiro. A facilidade para abertura de ações judiciais por meio de documentos falsos, sem fiscalização adequada, torna o Judiciário vulnerável a esse tipo de fraude em larga escala. O uso indevido do nome de cidadãos, especialmente os mais vulneráveis como aposentados, evidencia a necessidade urgente de revisão nos mecanismos de verificação de identidade e autorização legal em processos judiciais.
A Polícia Civil também alerta que muitas das vítimas ainda podem não saber que seus nomes foram utilizados para abertura de processos fraudulentos. O apelo das autoridades é para que qualquer pessoa que receba depósitos bancários inesperados ou identifique descontos não autorizados em seus benefícios procure imediatamente o banco ou a Justiça para verificar a origem desses valores. A maioria dos golpes dependia da passividade das vítimas para se concretizar, o que reforça a importância da informação e da denúncia.
A Operação Malus Doctor reforça a importância da integração entre as forças policiais e o sistema judiciário no combate a fraudes desse tipo. A expectativa é que a repercussão do caso sirva de alerta para que outros estados fortaleçam seus mecanismos de fiscalização de ações judiciais e de atuação de advogados. Além disso, o Ministério Público e a Ordem dos Advogados do Brasil devem acompanhar de perto os desdobramentos do caso, uma vez que profissionais da advocacia estão diretamente implicados na fraude.
Autor: Artur Matveev